segunda-feira, 7 de outubro de 2024

CONSELHO... SE FOSSE BOM...

 Dino de Alcântara

 

A José Neres, que me narrou essa história,

 numa travessia ao Cujupe.

 

Quando a Lucinha chegou com as suas coisas (uma mala grande, um baú com apetrechos, um espelho de parede, etc.) à casa do Coronel Serqueira, na Fonte do Ribeirão, depois de um casamento no civil, bem simples, celebrado pelo juiz Dr. Bentivi, ele achou por bem dar uns conselhos a sua esposa.

18 anos, filha de gente de Alcântara, Lucinha não era propriamente uma mulher de muitas exigências. Isso o coronel percebeu logo que tratou com os pais dela sobre o casamento. Mas ouviu da mãe uma questão preocupante: a filha era muito possessiva. Não ia admitir as saídas do marido, que, as más línguas falavam, tinha um defeito: era dado às saídas noturnas.

 O coronel, 50 anos bem vividos, no terceiro casamento, depois que acomodou a esposa, chamou-a para a varanda da casa para uma conversa, isto é, uns conselhos.  A conversa foi longa, enveredou por diversos assuntos, como filhos, asseios, limpeza das partes íntimas, etc. Aí, de mansinho, como um sábio, um veterano, entrou no assunto:

 

– Tu vês uma plantinha. O casamento é como uma plantinha. Se tu pegas uma plantinha e cuida dela como um brinquedo, botando no colo todos os dias, tirando a liberdade dela, ela vai murchar e morrer. É preciso dar boa terra, boa água e deixá-la livre, no sol, para que possa crescer livre. Assim é o casamento. Tua mãe me falou que és uma pouco possessiva. Olha, benzinho, isso só estraga os casamentos.

Ela balançou a cabeça, como se concordasse.

– Então, o que eu quero dizer é que, algumas vezes, eu, como sou coronel, como bem tu sabes, preciso sair à noite, sozinho, porque é assunto de homem, e tu vais ficar em casa me esperando.

Ela baixou a cabeça, como se estivesse atônica. Finalmente assentiu. Disse que ia pensar.

Pensou. Concordou com o esposo. Deixaria que ele saísse duas vezes na semana. Só queria ser avisada com antecedência, para não programar nada nessa noite.

Serqueira, tentando controlar um risinho malicioso, abraçou a mulher e a beijou na testa.

***

Algum tempo depois, o coronel Serqueira era todo alegria. Nas noites de quarta e sexta, as pândegas noturnas, ora no Cabaré da Lola, ora na Boate Sexus, o faziam um dos homens mais felizes da cidade. Dizia aos amigos de farra, que sempre soubera dar bons conselhos às esposas. Essa tinha sido a mais fácil de dobrar. Não precisou nem argumentar muito. E ria como se fosse um sheik rodeado de mulheres.

***

Numa noite de sexta, com ventos fortes soprando das bandas do Anil, uma rede com varandas grandes fazia ranger as escarpas já um tanto gastas pelo tempo. Dentro dela, dois corpos viajavam pelas ilhas do prazer. Lucinha se sentia como uma plantinha tomando o seu sol.   


 

 

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

ANDAR ATRÁS DE MULHERES

 Dino de Alcântara

 

Antes da chegada das estradas, que, aliás, estão em péssimas condições, as pessoas andavam, no Cujupe, em caminhos – ou, como Chico Cavalcante costumava dizer, caminhos do mato.

Como eram estreitos, os caminhos permitiam a chamada fila indiana, um atrás do outro, nunca ao lado, como nos passeios em São Luís. E, costume desde os tempos do Brasil Colônia, os homens andavam atrás das mulheres. Segundo Manoel Cavalcante, pai de Gregório, o costume era assim porque os homens protegiam as mulheres de um ataque de uma onça ou de outro bicho grande. Andar na frente, a onça pulava na mulher, e o homem nem sabia. Por isso, o costume de andar sempre atrás. “De dia ou de noite, bota-se a mulher na frente!”, costumava dizer aos filhos. 

 
 Detalhe: Caminhos do Cujupe.
 
Não estava pensando em caminhos do Cujupe, nem em onças, referidas pelo sogro, quando Bazilha, esposa de Gregório, conhecido em toda a região por ser um velhaco, um predador, um gavião à caça de mulheres, o chamou à razão:

– Olha, Gregório, isso não tá certo.

– O que, pequena?

– Isso de tu andar atrás das mulheres? Olha isso é muito feio!

– E tu queria o quê, que eu andasse na frente?

 

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

SOM NO CARRO?!... SÓ SE FOR BAIXINHO...

 Dino de Alcântara

 
 

    Numa recente conferência feita pelo professor Abdias Coelho, no Centro de Convenções de Matinha, um dado chamou a atenção da plateia: os brasileiros estão cada vez mais lendo com superficialidade os textos informativos, isto é, as informações são devoradas com tamanha rapidez, quase sempre pelas redes sociais, que os leitores, muitas vezes, captam apenas uma pequena parte do discurso, construindo, assim, um entendimento superficial do episódio, quando não totalmente avesso.

Semana passada, o professor Benevides, de Maracaçumé, divulgou um vídeo no seu perfil de Instagram em que mostra muito bem essa situação, que, cada vez mais, vem ocorrendo no Brasil. No vídeo, um anão interpreta uma nova portaria emitida pelo Fórum de Zé Doca de forma totalmente errônea, porque o fez através das redes sociais.   

Explica-se o episódio, narrado pelo mestre Benevides: um advogado foi até o Fórum da cidade de Zé Doca verificar o andamento de processos em que figurava como defensor. Lá chegando, viu afixada, num mural, uma portaria sobre o uso de som automotivo na cidade. Depois de muitas reclamações, solicitações, o magistrado resolveu baixar uma portaria proibindo som, nos veículos, em volume acima de 65 decibéis. O Advogado gravou um áudio, porque escrever daria muito trabalho e gastaria muito tempo, e colocou em dois grupos de WhatsApp. Logo, outros áudios foram feitos e enviados. A notícia se espalhou até no Cujupe, como se portaria tivesse vigor em Alcântara.

Detalhe: Som capaz de ofuscar até a 
Experiência do Som, Radiola do Cujupe.

Assim que ouviu o áudio, já bastante divergente do original, Ribinha de Zé Baiacu gravou um também e compartilhou em vários grupos. O áudio dizia apenas: “Galera, Estou aqui no Fórum de Zé Doca e acabei de saber uma informação repassada pelo Doutor Paulo. Diz que o juiz baixou uma portaria aqui. Agora som em carro, só se for baixinho. Quer dizer, você só pode botar o som no carro, mas só se for baixinho. Então galera, é isso!”

 No dia seguinte, após ouvir o áudio de Ribinha de Zé Baiacu, um cidadão de Zé Doca foi para a porta da quitanda de Aniceto, pediu uma cerveja antarctica e meteu o som no carro. Bem alto. E nem se preocupou com volume, já que a portaria era bem clara: “Som no carro, só se for baixinho”. 



 

 


 

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

OS DOUTORES DA LEI

 Dino de Alcântara

 

Teatrinho a Vapor

 


PROFESSOR MARCOS – Docente do Curso de Direito da UFMA.

RODRIGO – Discente do Curso de Direito da UFMA.

Figurantes – Alunos do Curso de Direito.

 

Cenário: Sala de Aula do Curso de Direito, CCSo, UFMA. Aula de Direito Penal.

A cena passa-se em agosto de 2024.

 

PROFESSOR MARCOS (com o Código Penal aberto.) – Um bom advogado não é aquele que conhece de cor e salteado, como se diz aqui no Maranhão, o Código Penal Brasileiro, mas aquele que, diante de um crime, encontra facilmente o artigo que trata do tema em questão.

RODRIGO – Professor, essa questão é muito boa. Para o senhor, o que é um bom advogado mesmo?

PROFESSOR MARCOS – Um bom advogado deve reunir vários elementos em si. Conhecer bem o código, conhecer o processo, ter uma linha de defesa, etc. Às vezes, já se sabe que o réu será condenado, mas, com uma boa defesa, ele tem direito à ampla defesa. Por quê? Porque tem um bom advogado.

RODRIGO – E um excelente advogado?

PROFESSOR MARCOS – Aí são os grandes gênios da advocacia. Precisa ter um bom escritório, com conhecimento das entranhas dos tribunais não só de primeira e segunda instâncias, mas da última também, como o Superior Tribunal de Justiça, etc.

RODRIGO (Com um risinho cínico.) – Papai, que não é advogado, mas sabe melhor do que ninguém o que é a justiça deste país, tem uma ideia diferente...

PROFESSOR MARCOS – Qual a ideia?

RODRIGO – Ele costuma dizer que um advogado bom conhece a lei. Um advogado muito bom conhece a lei e o juiz. E um excelente advogado conhece a lei, o juiz e a conta bancária dele.


 

 

PELO SIM, PELO NÃO....

  Dino de Alcântara  CONTO-ANEDOTA   Não se sabe com precisão como no Maranhão as clínicas de depilação (sim... até nas partes íntimas) ...